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Comida que Abraça: como as marcas podem se conectar emocionalmente com o consumidor?

  • Foto do escritor: Dalton Bermejo Wang
    Dalton Bermejo Wang
  • 7 de jun.
  • 6 min de leitura
Em um mercado saturado por opções, sabores e promessas, o que realmente faz um consumidor escolher uma marca em vez de outra? Mais do que preço, conveniência ou até mesmo qualidade, há algo mais profundo em jogo: a conexão emocional. E no universo da alimentação, essa conexão pode ser ainda mais poderosa. Afinal, comida é afeto, memória, pertencimento. Quando bem trabalhada, a comunicação de uma marca pode transformar um simples produto em uma experiência acolhedora — quase como um abraço. Mas como fazer isso de forma estratégica e autêntica?


Grupo de jovens sorrindo e brindando com Coca-Cola em uma mesa de jantar em um ambiente aconchegante, promovendo o sabor e a sensação de união.


O que significa “comida que abraça”?

A expressão “comida que abraça” tem se popularizado como uma metáfora para descrever alimentos e experiências gastronômicas que despertam conforto emocional. Ela remete ao conceito de comfort food, expressão americana que designa comidas que trazem conforto psicológico, geralmente associadas à infância, à família ou a momentos de segurança emocional.

Esse tipo de comida não precisa ser gourmet ou elaborada — às vezes é um prato simples como arroz com feijão, um pão na chapa com café ou um brigadeiro feito em casa. O que importa não é a complexidade do prato, mas a carga afetiva que ele carrega. Para as marcas, entender esse fenômeno é o primeiro passo para criar narrativas mais próximas, humanas e memoráveis.


A neurociência por trás do afeto na alimentação

Diversos estudos mostram que alimentos ativam regiões do cérebro ligadas à recompensa e ao prazer, como o sistema límbico. Quando o ato de comer é associado a boas lembranças, como um jantar de domingo com a avó ou uma receita típica das festas de fim de ano, essas emoções se tornam ancoradas ao produto consumido. Isso é chamado de memória afetiva.

A publicidade emocional trabalha justamente com esse tipo de memória. Marcas que exploram esses gatilhos emocionais — de forma ética e autêntica — conseguem criar brand love (amor à marca), fidelizando consumidores por razões muito mais profundas do que o valor nutricional ou o preço.

Mulher sorridente com grupo de pessoas jantando em uma mesa bem decorada, com comida italiana, na casa de modo aconchegante e moderna.
Comercial da Barilla para promover a massa sem glúten

Barilla e o poder da comida que abraça

Um exemplo recente e sensível de como uma marca pode se conectar emocionalmente com o consumidor através do universo da comfort food é a campanha da Barilla para o lançamento da sua massa sem glúten. Com o slogan “Esse comercial não contém glúten”, a marca aposta em um jogo de palavras inteligente para comunicar a novidade de forma leve e afetiva. A frase, direta e bem-humorada, surge sobre a imagem de uma refeição entre amigos, em um ambiente acolhedor, quente e familiar — evocando o tipo de momento que nos faz sentir abraçados por dentro.

A escolha estética da campanha reforça o conceito “Comida que abraça”, um posicionamento que transcende ingredientes e valoriza o afeto, a inclusão e o prazer de estar à mesa. Ao mostrar diversidade, sorrisos genuínos e um clima de intimidade, a Barilla transforma a ausência de glúten não em uma limitação, mas em um gesto de cuidado. Nesse contexto, a marca consegue comunicar seu propósito com profundidade emocional, usando a linguagem universal da comida como um elo entre pessoas diferentes, com necessidades distintas, mas que compartilham o mesmo desejo: sentir-se bem.

Mais do que um produto, a campanha entrega uma experiência emocional, provando que a verdadeira comfort food está menos no que se come e mais no que se sente.


Storytelling: o poder das histórias verdadeiras

Uma das ferramentas mais eficazes para criar essa conexão é o storytelling, ou seja, contar histórias. Mas não qualquer história: é preciso que elas sejam verdadeiras, comoventes e coerentes com a identidade da marca. Em vez de vender um produto, marcas que “abraçam” contam histórias sobre quem produziu aquele alimento, a origem dos ingredientes, ou sobre os momentos em que aquele prato faz parte da vida das pessoas.

Um exemplo clássico é a campanha "Todo mundo tem um Nescau" — em que a marca deixa de focar apenas no achocolatado e passa a associá-lo aos momentos da infância, às brincadeiras e ao carinho dos pais. Não se trata apenas de vender Nescau, mas de vender uma sensação de acolhimento.


Design emocional: a experiência começa antes da primeira mordida

A embalagem, o nome do produto, o ambiente da loja, o cardápio, a paleta de cores nas redes sociais… tudo comunica. E tudo pode ser usado para reforçar a ideia de acolhimento. O design emocional é uma abordagem que entende o visual e a experiência do usuário como pontos de contato com os sentimentos do consumidor.

Por exemplo: uma marca que aposta em produtos caseiros pode optar por rótulos com ilustrações manuais, tipografia manuscrita e textos que remetem à cozinha da vovó. Já um restaurante com proposta nostálgica pode usar elementos como toalhas de mesa quadriculadas, móveis retrô e músicas antigas.

Esses pequenos detalhes ajudam a criar uma experiência sensorial e emocional completa, que começa antes do cliente provar a comida e continua mesmo depois que a refeição termina.


Marketing sensorial: explorando os 5 sentidos

Além da visão e do paladar, marcas que querem provocar emoções devem considerar os outros sentidos. Isso se chama marketing sensorial — uma abordagem estratégica que busca envolver os consumidores por meio de estímulos táteis, auditivos e olfativos, além dos visuais e gustativos.

Exemplos:
  • Olfato: algumas cafeterias liberam propositalmente o aroma do café moído na entrada da loja para atrair clientes.
  • Audição: restaurantes que tocam música ambiente suave estimulam o relaxamento e o tempo de permanência.
  • Tato: embalagens com texturas agradáveis transmitem cuidado e aconchego.

Esse tipo de estímulo fortalece o vínculo emocional, pois ativa múltiplas áreas cerebrais ao mesmo tempo, tornando a experiência mais marcante.


O papel do branding humanizado

Hoje, marcas precisam ser mais humanas. Isso significa adotar uma comunicação empática, acessível e autêntica. Uma marca de comida que se conecta emocionalmente é aquela que entende as dores, desejos e realidades do seu público. Mais do que vender, ela cuida.

O branding humanizado envolve ações como:

  • Usar uma linguagem próxima e coloquial nas redes sociais.
  • Mostrar os bastidores da produção e os rostos por trás da empresa.
  • Valorizar a cultura local e as tradições alimentares.
  • Estimular conversas reais com a comunidade.


O fenômeno da nostalgia: passado como ferramenta de marketing

A nostalgia é um gatilho emocional poderoso. No mundo da alimentação, isso se traduz em receitas de infância, doces de vó, sabores “de antigamente”. Muitas marcas vêm usando esse sentimento como uma ponte para construir conexão.

A volta de embalagens antigas, slogans clássicos ou sabores que marcaram época são estratégias que remetem à chamada retrobranding — uso do passado como ativo estratégico para se destacar no presente.

A Lacta, por exemplo, lançou versões comemorativas com identidade visual dos anos 1980, gerando engajamento e vendas ao acionar a memória afetiva de adultos que cresceram com a marca.


Quando a experiência vira propósito

Cada vez mais, consumidores valorizam marcas com propósito — ou seja, que sabem por que existem além do lucro. E quando esse propósito está alinhado com o bem-estar, o afeto e a comida de verdade, a conexão é natural.

Marcas como Raízes do Campo, que trabalham com produtos agroecológicos e valorizam pequenos produtores, ou iniciativas como o restaurante Banzeiro, que promove ingredientes e saberes da Amazônia, não estão apenas vendendo comida: estão nutrindo histórias, pessoas e territórios.

O consumidor contemporâneo quer sentir que está fazendo parte de algo maior. E quando uma marca oferece isso com sinceridade, ela se torna mais do que uma escolha — ela vira uma extensão da identidade do cliente.


Como aplicar isso na prática?

Para que marcas do setor alimentício consigam criar esse tipo de conexão emocional com seus consumidores, é importante seguir algumas diretrizes:

  1. Conheça seu público a fundo: entenda suas dores, sonhos, memórias e referências. Faça pesquisas qualitativas e escute com empatia.
  2. Construa um posicionamento emocional claro: o que você quer que as pessoas sintam quando consomem seu produto?
  3. Invista em storytelling: conte histórias reais, com começo, meio e fim. Humanize sua marca.
  4. Aposte na estética afetiva: design, linguagem e ambientes que geram acolhimento.
  5. Seja coerente em todos os canais: da embalagem ao Instagram, tudo deve reforçar a mesma emoção.
  6. Valorize o local e o cultural: comida é identidade. Quanto mais você mostrar suas raízes, mais autêntico será.
  7. Não tenha medo de ser sensível: marcas que tocam o coração são lembradas.


No final das contas, comida que abraça é mais do que marketing — é um convite à sensibilidade, à memória e à construção de relações mais humanas. Marcas que entendem isso não apenas vendem mais: elas permanecem. Em um mundo acelerado e muitas vezes impessoal, oferecer afeto em forma de comida é uma poderosa estratégia de diferenciação, fidelização e relevância.

Porque, no fundo, todos nós estamos em busca de uma boa refeição — e de um bom abraço.

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